sábado, 12 de dezembro de 2009

Dia 9, domingo - 29/08/2009 - Torres Del Paine – Destino: Acampamento Italiano – Dia 2

Como mágica hoje acordei completamente revitalizado do dia anterior e disposto a encarar mais desafios, eram sete da manhã e o frio permanecia castigando, decidi não tomar banho pela manhã, mesmo sabendo que o próximo seria somente na volta a Puerto Natales, um detalhe que acabei esquecendo de mencionar no relato do dia anterior foi o esquecimento da escova e do creme dental em Puerto Natales, sem isso tive que me virar com algumas raízes de plantas e usar até xampu que eu tinha na mochila. Pela manhã fiz o mesmo, me troquei e preparei minha mochila deixando aquilo que eu considerava desnecessário para trás, acredito que desde ponto em diante consegui reduzir em pelo menos 5 kg o peso total.
Ao chegar à sala encontrei as suíças e o dono da tal barraca do relato de ontem, hoje conversamos e agora ele tem um nome, era Pablo, um espanhol que vive na Bolívia.
Clement já não estava, pois havia saído para chegar ao glaciar Grey, segundo o que disseram, ele tentaria fazer o percurso W completo e nos alcançar no acampamento italiano à noite.
As suíças haviam decidido fazer o mesmo percurso que eu, abdicando também da visita ao glaciar, mesma decisão tomada por Pablo. Conversamos um pouco ainda analisando o mapa e o que seria possível fazer no dia, o acampamento italiano fica a 7,6 Km (duas horas aproximadamente) de onde estávamos, porém para fazermos a segunda perna do W teríamos que subir até o acampamento britânico distante 5,5 Km do italiano (2 horas e meia), de onde ainda partiríamos para chegar a um mirante, distante 2 km do acampamento britânico, mais meia hora. Depois o percurso de volta até o acampamento italiano onde passaríamos a noite. Em resumo, para o dia tínhamos 22,5 Km para percorrer com uma estimativa de duração de 7 horas, sem considerar as paradas para almoço, descanso, etc.
Clement seguiu rumo ao glaciar grey e tentaria nos encontrar no acampamento italiano a noite, caso ele decida seguir conosco desse ponto em diante vai abdicar da segunda perna do W, o acampamento britânico.
Depois de conversarmos bastante sobre o caminho decidimos iniciar o trekking, já eram 09h15min quando deixamos a hostelaria.
Novamente todo aparato contra o frio era usado, toca, luva e cachecol, a temperatura externa estava por volta de -7°C e alguns minutos foram suficientes para começar a sentir calor.
Pablo seguia na frente, parecia bem mais acostumado a esse tipo de trekking, na Bolívia ele já havia feito algumas expedições em lugares e até mesmo mais frios.
A disposição aumentou desde a última noite e eu conseguia acompanhá-lo na frente, Pablo é agrônomo e nasceu em Barcelona, hoje trabalha com desenvolvimento de povos na América latina, dizia que já esteve no Brasil por dois anos trabalhando na Amazônia, também com a mesma finalidade. Atua normalmente em ONGs e a atual tem ligação com o governo Boliviano de Evo Morales, conversamos um pouco também sobre política, não diria que Pablo chega a ser um extremista, mas acredita em questões nobres, não parece ter tantas vaidades e passa uma imagem de integridade.
A dificuldade nesse trecho é média, passamos por algumas planícies, mas encontramos durante o caminho, principalmente na última parte muitas montanhas e pedras para cruzar, o tempo não parecia estável, mas não tive problemas quanto a isso, apenas nevou um pouco na chegada, nada que interferisse no trajeto.
No caminho perguntei a Pablo, por ser de Barcelona, se já havia feito o caminho de Santiago de Compostela, pois era algo que gostaria muito de fazer um dia, conversamos a respeito e estou de fato amadurecendo essa idéia, talvez faça em 2011, algo que preciso ainda decidir... Pablo não chegou a fazer o caminho completo, todo o caminho corresponde a uma distancia de quase mil quilômetros.
Logo chegamos (Pablo e eu) no acampamento italiano, lembro-me logo da chegada cruzamos por uma ponte estreita feita de madeira que cruzava um dos canais que resultava do derretimento do glaciar do francês.
A chegada ao acampamento italiano indicava então um momento de descanso, aproveitei para recarregar a garrafa d’água no rio. Algo importante a comentar é que todas as fontes de água dentro do parque torres del paine são potáveis, na maior parte dos casos provem do derretimento dos glaciares ou mesmo do cume congelado das montanhas.
O acampamento estava vazio, sem nenhuma infra estrutura, mas o lugar parecia pelo menos mais protegido do vendo pelo menos. Esperamos as suíças chegarem e então seguimos para o acampamento britânico, um trecho mais difícil por causa da neve que agora chegava ao tornozelo e também pela subida forte, a idéia era chegar ao mirante para apreciar a vista. Como a base seria o acampamento italiano as mochilas ficaram, colocadas no alto lembrando o que havia sido dito quando às raposas que seguem os aventureiros. Comigo levei apenas a garrafa d’água, câmera fotográfica e bastão de caminhada.
Logo na base conseguimos ver o glaciar do francês, a subida toda cruza a região indicada no mapa como vale do francês, passamos em alguns momentos por pedras, cachoeiras congeladas e depois por florestas mortas. Durante a subida encontramos dois alemães, cujos nomes também não me recordo. Haviam subido mais cedo e contavam sobre a condição das trilhas, diziam que tinha neve até o joelho no acampamento britânico, porém que era possível chegar até o mirante para observar as torres e o vale do francês, conversamos mais um pouco com os dois e seguimos subida.
Mesmo antes de alcançar o mirante apreciamos vistas surpreendentes pelo caminho, eu havia levado a garrafa vazia esperando que pudesse encontrar água no caminho, mas tudo havia congelado e me restou encher a garrafa com neve e descongelar com a transferência do calor das mãos para garrafa, isso acabou me rendendo alguns dedos dormentes, mas a sede foi saciada.
Depois de duas horas e meia de subida chegamos ao acampamento britânico, eu imaginava que não encontraríamos estrutura, tão pouco alguém no acampamento, mas de fato não havia absolutamente nada além da placa de indicava que chegamos ao acampamento. O lugar então serviu de descanso, tínhamos agora mais meia hora de caminhada até o mirante de onde retornaríamos para o acampamento italiano, a base do segundo dia.
Aqui a quantidade de neve aumentava bastante e comprometia a velocidade da caminhada, a meia hora virou cinqüenta minutos, mas tanto a bota quanto a polaina resistiram bem e não tive problemas quanto a molhar os pés.
Caminhando no inverno tão rigoroso é muito importante proteger as extremidades do corpo, molhar os pés aqui seria uma tragédia.
O local do acampamento britânico deveria ser de fato um refúgio, havia várias arvores, mas a grande maioria delas já sem vida, mortas pelo inverno, algumas não conseguiram resistir ao peso da neve e racharam no tronco, alguns minutos depois chegamos numa área descampada, deixando para trás o pequeno bosque sem vida, de lá conseguimos ter uma boa vista das torres, o tempo abriu e o céu ainda conservava seu tom azulado.
Mais alguns minutos cruzando o vale do francês e chegamos finalmente ao mirante, o destino do dia. O frio ali era ainda maior, era o ponto de maior altitude desde o acampamento italiano, o vento soprava com força.
Decidimos que utilizaríamos o lugar para comer alguma coisa, eu havia levado nos bolsos alguns pacotes de bolacha além de uma tangerina, ficaríamos vinte minutos no mirante e Pablo aproveitou para ascender um cigarro enquanto também apreciava a vista.
Quase chegando ao final desse dia e a sensação era completamente diferente do dia anterior, aquela noite de sono fora realmente milagrosa e agora me sentia com mais vitalidade e embora já tivesse enfrentado bons desafios ainda me sentia apto para caminhar longas distâncias, é claro que vale a pena mencionar também que esse ultimo trecho foi feito sem as mochilas, o que foi fundamental já que o principal problema que enfrentei era realmente a dor nas costas e nos ombros.
A vista do ponto mais alto no vale do francês era impressionante, olhando de cima víamos toda extensão do vale, o vento soprava forte e levava a neve ainda solta no solo, a direção do vento havia mudado agora e nos empurraria na volta no sentido do acampamento britânico e italiano, penso que a partir daquele momento, quem ainda tivesse alguma pretensão de chegar ao mirante teria mais dificuldade.
Uma sensação de conquista estava presente naquele momento, lembrei do dia anterior em Las Carretas quando fiquei muito próximo de desistir de continuar e me sentia feliz por ter tomado aquela decisão, mesmo que um pouco irracional.
Iniciamos a decida, sem muitas paradas dessa vez, pois o objetivo era chegar o mais cedo possível no acampamento para preparar tudo. Eu estava um pouco preocupado também com as suíças que lá ficaram, elas disseram que também viriam até o mirante, porém nenhum sinal delas e o tempo piorava a cada minuto.
Em vinte minutos chegamos ao acampamento britânico e mais vinte minutos encontramos as duas que subiam sumo ao mirante, paramos um pouco para conversar e elas estavam bastante cansadas e decidiram também retornar conosco, por precaução também, já que o tempo havia mudado e a nevasca aumentava.
Pablo e elas decidiram ainda parar para fumar no caminho, eu segui retornando para o acampamento e nos encontramos novamente quando parei para buscar água.
Chegamos ao fim da tarde ao acampamento para preparar tudo, elas já haviam montado a barraca, encontramos um abrigo do vento e conseguimos colocar as três barracas lá dentro, estávamos na companhia dos últimos raios de luz do dia, aproveitamos então para cozinhar. Preparei uma sopa com macarrão que tinha comigo e também uma boa porção de purê de batatas, o cheiro estava bom e compartilhamos o jantar, nesse dia também preparei suco, tinha comigo um pacote de pó instantâneo.
Comiamos e conversávamos sobre o dia e sobre outras coisas, já era noite e nossas lanternas estavam acesas. É extremamente proibido fazer fogueira no parque em função até mesmo do histórico de vários incêndios, principalmente no verão quando a quantidade de aventureiros é bem maior.
De longe vimos uma pequena lanterna se aproximando do acampamento, era Clement que chegava ao acampamento. Um pouco arriscado caminhar à noite naquele lugar, mas ele parecia experiente. Todo abrigo estava tomado por nossas barracas e Clement precisou se acomodar em outro local, não muito longe dali.
Preparei-me para dormir, novamente escovando os dentes com alguns pedaços de raiz de plantas e algumas gotas de xampu, a água gelada fazia os dentes doerem.
As garrafas d’água eram abastecidas no rio que passava por baixo da ponte estreita que passamos pela manhã quando chegamos ao acampamento. Havia somente um pequeno e fino fluxo no centro, as bordas estavam congeladas.

Voltei para a barraca rapidamente, agora são 21 horas e espero pela mesma noite milagrosa do dia anterior.

Dia 8, sábado - 28/08/2009 - Partindo de Puerto Natales – Destino: Parque Nacional Torres del Paine/ Acampamento Paine Grande – Dia 1

Na noite passada o sono tardou a chegar, a ansiedade e o medo de não acordar no horário certo também não me deixava dormir, por fim consegui pegar no sono por causa do cansaço. A noite passou rápido e logo acordei assustado, não levei meu celular comigo na viagem e normalmente o uso como despertador. Beth havia me emprestado o despertador de sua filha e o motivo da preocupação era que o tal aparelhinho pudesse falhar... Tudo certo pela manhã, eram 6 horas e o horário combinado do transporte era às 8:00. Mais uma vez verifiquei tudo aquilo que levava na mochila, conferi se o peso estava bom e fechei.
No dia anterior no supermercado comprei três litros de leite longa vida, uma má decisão, além de outras que me cobrariam durante o trekking. Cheguei a abrir uma das garrafas, porém a tampa não vedava de forma adequada e coloquei então o leite (um litro), dentro do cantil de água, o mesmo leite que amanheceu estragado no dia seguinte cheirando mal.
Tomei um banho demorado, Sabia que sentiria falta dele por alguns dias, me sentia orgulhoso pelo roteiro que tinha feito até ali e embora me aproximasse ainda do final do primeiro terço da viagem, tudo corria bem conforme planejei.
Tomei café da manhã, Beth ainda não havia acordado e seu marido preparava também o café da manhã, às 7:40 saí da casa e fui até esquina, estava com muito medo de por algum motivo perder o transporte para Torres, quase 8:00 e nada da van, comecei a ficar preocupado e retornei à casa de Beth, encontrei seu marido e comentei que estava preocupado, mostrei a ele o ticket e ele reconheceu e disse para que esperasse que passariam para me pegar ali mesmo, achei então que a Beth já havia me dito isso antes, mas não entendi de forma apropriada. Esses dias entre Chile e Argentina me fizeram praticar bastante meu portunhol, a principio quando cheguei em Buenos Aires usava o inglês, mas logo percebi que não era necessário e depois seria uma boa oportunidade de aprender alguma coisa com nossos “hermanos”.
Às 8:15 eis que chega a tal van, me apressei para sair e a mochila entalou um pouco na porta da casa, me despedi, esperava voltar ao mesmo local em quatro dias para me recompor.
A mochila foi colocada no porta-malas traseiro da van e embarquei junto com duas garotas que já lá estavam. Percebi que não eram chilenas, depois de embarcar ouvi que elas falavam francês, mais tarde então elas disseram que eram suíças, duas amigas que viajavam juntas pela América latina, o próximo destino seria o Brasil, no Rio de Janeiro e Ilha do Mel.
Não quis conversar tanto, estava imaginando como seria o lugar, com meu mp3 ouvia musica enquanto olhava pela janela da van a paisagem que ia mudando conforme saiamos da cidade, ainda antes de pegarmos a estrada a van fez mais uma parada num outro hostel cujo nome não me recordo, dele saiu mais um aventureiro, um francês chamado Clement que também viajara sozinho pela América, ele diferentemente de mim fazia o caminho inverso vindo do norte em direção ao sul, patagônia e terra do fogo.
A van então seguiu na estrada para o parque, passamos perto da fronteira com a Argentina. O motorista falava bastante e nos contava historias e dava dicas sobre o parque, tanto Clement, quando eu e as duas suíças estávamos fazendo esse trekking pela primeira vez, mas dos quatro eu era o menos experiente e um pouco inconseqüente até, já que esse não é necessariamente o melhor destino para iniciar uma aventura inédita de trekking.
O parque é protegido pelo governo chileno, tanto a flora quanto os animais. No caminho avistamos muitos guanacos, animais que acabam servindo de alimento para o pumas que vivem aqui, na região patagônica existe uma grande concentração de pumas selvagens, motivo pelo qual encontramos uma van com duas pessoas no caminho, um deles carregava uma grande câmera, o motorista contou que eram jornalistas que estavam há um ano acompanhando a vida dos pumas para criação de um documentário, para tanto é preciso acompanhar seus hábitos desde o verão até o rigoroso inverno patagônico.

Os pumas têm hábitos noturnos e se alimentam de carne, normalmente saem para caçar a noite saindo das tocas quando ainda há luz para escolher suas vítimas, depois que a escuridão chega, eles atacam... Perguntando sobre históricos de ataques desses animais a seres humanos o motorista nos contou sobre um episódio recente (4 anos), dois pescadores nas proximidades do parque, um deles se distanciou para fazer suas necessidades quando percebeu um guanaco vindo em sua direção disparou a correr, não seria um problema se atrás do guanaco não estivesse vindo um puma que se viu diante de duas presas, uma delas o guanaco correndo aproximadamente 60km/h, outra o homem, por instinto o puma escolheu o homem e o matou. Depois disso caçadores tiveram que encontrar o puma e sacrificá-lo, a justificativa para isso? O animal poderia passar a partir daí a caçar seres humanos como uma presa mais fácil que o quadrúpede.
Acho que vale a pena falar mais um pouco sobre o puma, esse felino depende do elemento surpresa nas suas caças, sua velocidade de 50Km/h não seria suficiente para alcançar o guanaco num campo aberto, por isso sua caça é planejada.
Quanto aos guanacos, não menos inteligentes, estão normalmente em bando, sozinhos seriam uma preza fácil, dentre eles é eleito um membro, o guarda!, o guarda fica estático, sobre uma grande montanha sem se alimentar por semanas e preserva pela segurança do bando, ele observa se há movimentação do puma na região e avisa os demais em caso de perigos.
Como predadores, além do puma o parque abriga a maior ave, o condor, que costuma fazer vôos rasantes em busca de pequenas ovelhas em fazendas próximas ao parque. Os condores podem ter além 1 metro e 30 centímetros de altura, da pata até a cabeça e aqui são encontradas aves com até dois metros de envergadura.
Quanto às raposas, o parque tem dois exemplares, a cinza (grey fox) e a vermelha (red fox), animais de menor porte que normalmente caçam aves terrestres ou se alimentam da comida de aventureiros desavisados.
O motorista nos alertou a nunca deixarmos nossas mochilas em lugares baixos, e manter as botas sempre dentro das barracas, já que o cheiro atrai nossas amigas...
Ainda sobre os animais, as dicas e comentários podem até lembrar uma visita a um zoológico, mas o bacana de tudo isso seria ter a oportunidade de observar alguns animais totalmente selvagens, sem a abstração humana para transformá-los em atrações para crianças.
Saímos da estrada pavimentada e entramos numa estrada de terra que cruza para o parque e fizemos algumas paradas para mais fotos, o frio era cortante, mas o visual era impressionante...
O trajeto de Puerto Natales até o parque durou duas horas e meia, chegamos então na sede administrativa, limite para a van e onde iniciaria a caminhada. Há duas formas de se fazer o circuito W, uma delas é iniciando pela “Guarderia laguna verde” e caminhar para oeste tendo como final a sede administrativa, a outra escolhida era o oposto, caminhando de oeste para leste... decisão acertada de acordo também o motorista da van, já que o vento sopra de oeste para leste, favorecendo a caminhada.
Na portaria serrano, de onde iniciaria a caminhada conversei com as suíças e com Clement, eles tinham cinco dias para terminar o trekking, eu comentei que precisaria fazer em quatro, então iríamos juntos até o final do primeiro dia e depois seguiríamos caminhos diferentes.
O fato de ter agora mais três pessoas comigo era positivo, colocava um pouco mais de segurança à minha imprudência.
O guarda-parque, depois de passar as instruções sobre como proceder, não fazer fogueiras, não alimentar os animais e etc, comentou que em função do inverno somente uma hostelaria estaria aberta, seria a primeira, os demais dias teriam que ser passados com acampamento sem infra-estrutura. Uma das garotas ainda perguntou sobre o puma, ela parecia um pouco assustada com as histórias contadas pelo motorista da van, o guarda-parque, muito solícito, explicou o que deveríamos fazer em caso de um possível encontro com o animal, explicou que a principio o homem não é uma presa para o puma, mas como o animal tem instinto selvagem o melhor a se fazer seria realizar movimentos lentos, nunca correr, olhar sempre nos olhos do animal (se possível com óculos escuros que possam fazer reflexo), e caminhar, lentamente para trás, se afastando do bicho...
Depois do “briefing”, tivemos que assinar um termo de responsabilidade e então fomos liberados para iniciar o trekking.
Já eram quase onze da manhã, a temperatura estava mais amena, cerca de 4°C, ideal para este tipo de atividade. Iniciamos eu e Clement à frente e as garotas atrás, agora havia tempo suficiente para conversar e conhecer melhor todos os três, no primeiro dia a distancia a ser percorrida seria de 17,5Km, que na estimativa do mapa nos daria 5 horas, passando pelo acampamento “Las Carretas” e depois terminando no refúgio “Paine Grande”.
Os primeiros 30 minutos foram tranqüilos, nesse primeiro trecho de duas horas a dificuldade é considerada baixa, é uma grande planície rodeada pelo rio Grey, porém aquilo que comentei no início do relato de hoje começou a influenciar, os 22kg da mochila do início da caminhada eram aumentados a cada km que caminhávamos, eu havia testado antes, mas creio que subestimei o peso ou superestimei minha força... o fato era que estava me sentindo exausto com todo aquele peso nas costas, mas de outra forma também não podia parar o tempo todo para não perder a companhia dos outros três... Fizemos a primeira parada com uma hora para descansar, nesse momento as suíças nos passaram e fizeram a parada um pouco mais adiante, senti um alívio nas costas no momento que retirei a mochila, o frio inicial sentido no início da caminhada tinha dado lugar a um calor quase insuportável, vestido com toca, luvas e cachecol já e sentia a camisa bem molhada de suor, depois de me hidratar e retirar o excesso de roupa. Continuamos a caminhada, o bastão que carregava comigo ajudava a dar sustentação e evitava que me curvasse tanto para frente a ponto de prejudicar a minha coluna.
Algo que sei é que se poderia apontar a principal dificuldade enfrentada neste dia resultante da pouca experiência, essa seria sem sombra de dúvidas a escolha do que levar na mochila... Mesmo tendo lido vários artigos sobre esse tópico na internet, na hora de preparar tudo fiquei com receio de não ter suprimentos suficientes ou mesmo ter que comprar em alguma hostelaria a um preço exorbitante.
Antes da viagem tive que comprar todo equipamento de trekking e roupas de inverno, a mochila foi comprada numa outra viagem que fiz a Foz do Iguaçu, já havia usado antes quando estive em Bariloche na Argentina, porém nunca como um item ativo de trekking e sim com uma finalidade unicamente cargueira.
Naquele momento, enquanto caminhava, pagaria qualquer preço por outra mochila que tivesse um ajuste mais correto ao corpo.
Essa dificuldade me privou de curtir mais o visual que tive no percurso, durante o caminho além do rio Grey nos acompanhava à esquerda, avistamos no descampado também alguns cavalos selvagens, alguns vivos, outros mortos, imagino que vitimas de algum puma...
A parada mais demorada, para um suposto “almoço” foi no acampamento “Las Carretas”, até aqui o mapa indicava duas horas desde onde iniciamos, meu cronômetro indicava que gastamos 2 horas e 12 minutos. Não cozinhamos nada, eu tinha algumas bolachas e chocolate, além de uma maça que me serviram de almoço, Clement preparou um sanduíche com queijo, salame e alguns pedaços de tomate que ali mesmo cortou. Nesse momento senti vontade de desistir, senti que não estava preparado para aquilo e temia piorar a situação caso avançasse a um ponto onde não houvesse nenhuma forma de me comunicar com algum guarda-parque... Pensei por alguns minutos e numa decisão novamente um pouco irracional, decidi continuar.
Havíamos avançado 7,5 Km até então, num percurso com grau de dificuldade baixa, a partir Dalí seriam mais 10 km em grau de dificuldade média devido a subidas e pedras.
O percurso era lindo, às vezes me sentia pequeno vendo toda aquela imensidão selvagem, às vezes me sentia forte por estar ali, por ter tomado aquela decisão de continuar.
Conforme avançava ia ficando pra trás, já que não conseguia acompanhar o ritmo dos três, ou fazia muitas paradas para descansar as costas, enquanto parava tirava algumas fotos do lugar.
Entre Las Carretas e Paine Grande, o destino, havia outra parada, o Mirante Pehoé, de onde se tinha vista para as torres à frente e o lago Pehoe à direita, uma das vistas mais bonitas que tive em minha vida, assim como o luar no caminho de volta dos Andes, numa viagem anterior à Bariloche.
O Mirante indicava 3 km para Paine Grande, indicava que meu descanso estava perto, uma sensação de alívio com um belo plano de fundo. Aqui nos juntamos novamente e com a motivação de ver as torres junto ao lago ganhei vigor para terminar o dia.
Já eram quase cinco da tarde e a luz começa a desaparecer, deste ponto em diante segui a frente do grupo e senti na pele o significado da palavra superação, o movimento das pernas era mecânico e constante enquanto os braços, já não mais com a função de levar o bastão de caminhada e sim servir de apoio para reduzir o peso da mochila nas costas, a parte do corpo que mais reclamava até então.

O ultimo trecho do dia foi a passagem pela beira do lago Pehoé, uma pequena montanha de pedras, no momento que cruzava ventava bastante e senti medo de escorregar, já que também começava uma fina garoa que deixava o solo escorregadio, imagino que a conseqüência de uma queda naquele ponto seria terrível, pela altura do ponto que cruzava, pelas pedras, pelo lago gelado somado ao frio quase congelante, avistei um pequeno barco, me lembrei que também é possível, além das opções que citei no relato de ontem, fazer um passeio de barco no lago pehoé, uma boa pedida, pois do lago pehoé é possível, praticamente de qualquer ponto avistar as torres.
Depois de um trecho onde precisei caminhar quase que agachado para proteção contra o vento, iniciei a decida que me levaria ao destino final do dia, já enxergava o acampamento e me sentia vencedor, alguns minutos depois chegaram as suíças (que não recordo os nomes, embora elas tenham dito...), também bastante cansadas, Clement havia ficado mais tempo no mirante tirando fotos enquanto seguimos viagem.
Conversamos sobre onde faríamos o acampamento, essa era a única hostelaria com infra estrutura de todo o percurso que estaria a principio aberta, havia ali também a possibilidade de passar a noite em uma cama de verdade, porém o preço era bem caro, estavam cobrando $12.000 CLP por pessoa, o valor para acampar era de $4.000 CLP, lá fora no local reservado para camping havia apenas uma barraca, o vento aumentou bastante e a barraca estava praticamente destruída, nos olhamos e por alguns minutos sabíamos exatamente o que passava na cabeça de cada um, seria uma noite difícil. O responsável pela hostelaria, vendo a péssima condição do tempo nos fez uma proposta, $30.000 para nós quatro, para que pudéssemos passar a noite lá.
Conversamos e decidimos aceitar, mas ainda precisaríamos esperar por Clement, assim que Clement chegou explicamos a ele a proposta e ele também aceitou, ficamos aliviados de não ter que passar essa noite no camping.
O lugar tinha quartos coletivos com dois beliches cada, como estávamos na baixa temporada não havia muitas pessoas na hostelaria. Tudo que eu queria naquele momento era um banho quente, depois de nos aquecer na lareira decidimos a ordem dos banhos, na minha vez tentei seguir as recomendações e abrir bem pouco a válvula e esperar até que a água se aquecesse. Longa espera e nada de água quente, imagino que a temperatura da água não passava dos 20°C, enquanto a temperatura, mesmo dentro da hostelaria estava em torno de 5°C, foi um dos banhos mais difíceis que tomei, tentava levar o pensamento a outras coisas ou pensar que o frio era psicológico... besteira, depois do banho me vesti e voltei imediatamente para a lareira, havia lá agora um senhor que conversava com Clement, era um americano de 54 anos, que viajava sozinho, ele se intitulava “gringo”, dizia que gostava muito das caminhadas, conversamos um pouco sobre os lugares que ele havia visitado, disse que antes da América do sul estava na polinésia francesa, minha dúvida maior era sobre Alaska e então ele disse também que já esteve por lá, porém fazendo uma espécie de cruzeiro.
Deixei algumas roupas molhadas, além da toalha, perto da lareira e atravessei os dormitórios rumo a cozinha, estava faminto e precisava preparar algo para comer. A condição dos $30.000CLP era que usaríamos a cozinha, porém com nossos próprios utensílios, que desejasse também receber um jantar quente pagaria algo em torno de $20.000CLP, por pessoa.
Preparei uma macarronada com sardinha, molho de tomate e queijo ralado, um belo jantar que me rendeu dores nas costas em função do peso das latas de conserva, comigo carregava até azeitonas e azeite de oliva... Decidi também compartilhar meus suprimentos e deixar lá aquilo que imaginasse que não comeria e que pudesse contribuir para reduzir o peso da mochila.
De sobremesa ainda tinha uma lata de morangos em conserva, comi alguns e dei o restante para as amigas suíças.
Após o jantar, fui até a sala onde encontramos o dono da barraca que citei, eles (Clement, as suíças e o dono da barraca...) falavam sobre o roteiro para o próximo dia, como eu comentei no início do relato, meu plano era fazer o que fosse possível em quatro dias, enquanto Clement e as suíças tinham cinco dias para tanto, essa decisão deveria ser tomada neste momento, já que para aqueles que dispõe de mais três dias o ideal é seguir para o acampamento italiano, para quem dispõe de quatro dias é possível visitar o glaciar grey, porém são três horas e meia de ida e o mesmo de volta.
Eu preferi não opinar nesse momento, mas sabia que teria que excluir o trilha até o glaciar grey, pois não tinha tempo. Para mim o fato de ter conseguido terminar o primeiro dia já era bom o suficiente, não pensava em adicionar mais um nível de dificuldade ao trekking.
Ainda saber o que iriam decidir sobre o dia seguinte, fui dormir para acordar disposto no dia seguinte, combinamos somente de nos encontrar ás 8:00 na sala para sairmos, para onde? Quem sabe...


A esperança é que essa noite de sono me dê se não mais vitalidade, coragem para chegar ao dia quatro.

Dia 7, sexta-feira - 27/08/2009 - Puerto Natales – Preparação para Torres del Paine

Acordei não muito cedo, esse dia serviu para organizar as coisas e me preparar com equipamentos e mentalmente para os quatro dias em Torres del Paine, o destino mais importante da viagem. Depois do café da manhã, conversando com Beth coletei todas as informações e já agendei transporte para o parque na manhã seguinte ($22.000 CHP ida e volta), às 08h00min.
Existem três opções para Torres del Paine, a primeira e mais interessante delas é o que se chama circuito grande, são onze ou doze dias seguidos de trekking, dá-se praticamente uma volta completa e chega-se a praticamente todos os mirantes do parque, a outra opção é o circuito W, que se deve fazer em cinco dias, eu arrisquei quatro. Nesse circuito se prioriza alguns pontos do parque, os principais, e não deixa de ser desafiadora, a terceira é a visita de um dia percorrido com uma van do lado externo ainda do parque, com certeza a pior delas, pois os melhores lugares só se podem ser alcançados caminhando, há também a possibilidade de se fazer parte do percurso a cavalo.
Nesta época do ano tanto o circuito grande quanto os cavalos não estão disponíveis, eu já havia escolhido o circuito W e estava ciente que teria que abdicar de algum trecho por ter somente quatro dias e não os cinco recomendados. O motivo do circuito grande não estar aberto é a quantidade de neve no parque, que cobre o joelho e chega até a cintura em alguns lugares, então tanto as trilhas ficam encobertas quanto pode esconder grandes perigos, buracos, pedras, etc.
Após fechar os detalhes, fui ao supermercado comprar todo necessário para sobrevivência nos quatro dias, já que ficaria por conta própria. Depois das compras voltei ao hostel para deixar as compras e sair para almoçar, ainda queria aproveitar um pouco a cidade e conhecer alguns lugares legais no resto da tarde. Comi uma pizza, fiz backup das fotografias da câmera num DVD e fui aproveitar o resto da tarde para conhecer a praia do lugar.
Puerto Natales é uma das cidades mais simpáticas que conheci nessa viagem, pequena, aconchegante, charmosa e pouco movimentada, assim como Pueto Varas, que devo mencionar mais a frente. Fria até não poder mais principalmente à noite, sair pra jantar aqui era bastante complicado.
A cidade se destaca também com o milodón, aqui é onde se encontra o momumento da “Cueva del Milodón”, Milodón foi um grande animal herbívoro extinto do período pré-histórico, esse era um possível destino, mas acabei abdicando de conhecer por não haver nenhuma excursão regular, para chegar teria que contratar um taxi que me levasse até o local com custo de $15.000 CLP.
O dia, apesar de frio estava ensolarado, antes de sair para caminhar, ainda no local onde conseguí fazer cópias das fotografias da câmera em DVD fiquei conversando por alguns minutos com uma senhora simpática do lugar, tocava uma música gostosa de ouvir, perguntei se era chilena (a música), ela respondeu que sim, era de um artista chamado “Natalino”, e a musica que tocava era “Desde que te vi”, depois “Si hablo he ti, hablo de mi”, pedi algumas indicações sobre musicas chilenas também e ela me citou alguns nomes que anotei para posterior pesquisa em casa.
Além de viajar, uma das minhas paixões é a música, embora não tenha conseguido aprender a tocar nenhum instrumento, depois de tentar tocar violão me conformei em ouvir apenas, e arriscar algumas coisas num “videokê”, depois de alguns goles é claro.

O passeio pela praia foi solitário, eu tinha companhia de alguns pássaros que flutuavam nas ondas, depois das pedras da praia, e um cachorro simpático que apareceu no caminho, eles sempre estão nos meus caminhos.
As garotas chilenas, com exceção de algumas, tem praticamente o mesmo biotipo, cabelos bem lisos, de tons castanhos a pretos, de baixa estatura e normalmente e peso médio, nesse dia passei por colégios no horário de saída, algumas histórias prefiro não mencionar (risos).


Depois de caminhar pela praia, voltei para organizar a mochila e enfim descansar para encarar a parte mais esperada de toda a viagem.

Dia 6, quinta-feira - 26/08/2009 - Partindo de Ushuaia – Viagem ao Chile, Punta Arenas e Puerto Natales

Hoje me despeço de Ushuaia, acordei bem cedo, (03h30min), pois o ônibus sairia às 05h00min. Como de costume atravessei o gelado quintal para tomar banho, falar que estava muito frio é “chover no molhado”, já às 04h10min estava tudo pronto e chamei um taxi para me levar até a rodoviária, a distância não era tão longa, são cerca de 15 minutos caminhando, mas queria tirar aquele dia para descansar de verdade. O taxi me deixou próximo de um posto de gasolina, na “suposta” rodoviária, bem perto do porto da cidade na parte baixa ($8,00), fiquei esperando por uns quinze minutos até que chegou o ônibus, nada muito confortável, pelo contrário, estava caindo os pedaços e parecia estar mais frio lá dentro que do lado de fora. Comigo embarcaram mais três pessoas. Nesta época do ano, baixa temporada, não há ônibus diários exatamente porque não há passageiros que os justifiquem. O meu trajeto até Puerto Natales seria feito em duas etapas. A primeira de Ushuaia até Punta Arenas e então de Punta Arenas até destino final, preço das passagens? $240,00 ARS, total de dezesseis horas de viagem.As 09h00min chegamos em Rio Grande, onde trocamos por um ônibus um pouco melhor. Conforme o dia amanhecia o sol insistia em não dar as caras, um dia não tão bom quanto os outros e parece que acertei o dia para viajar, era um dia daqueles que escolhemos para ficar em casa vendo tevê.
A viagem foi tranqüila fora o fato incômodo de ter que desembarcar três vezes com toda a bagagem para passagem pelas alfândegas argentinas e chilenas. Esta região desde a terra do fogo até a patagônia é toda recortada e às vezes mesmo imaginando uma linha reta do sul ao norte, entramos e saímos de Argentina e Chile sem de fato estarmos “voltando”.
No início da tarde, já em território chileno chegamos então ao estreito de Magalhães que é um dos estreitos mais importantes da região por ligar o oceano pacífico ao atlântico, é controlado pelo Chile. Um dos motivos que me fizeram escolher esse trajeto de ônibus foi justamente a travessia de balsa do estreito, na balsa era possível sair do ônibus e observar a travessia, mas já chovia bastante, cinco minutos do lado de fora foi o que consegui, molhei toda a roupa.
Voltando para o ônibus tente relaxar um pouco, não havia dormido até então na viagem, cochilei por alguns minutos e logo chegamos a Punta Arenas. O percurso todo cruza uma região desértica, são fazendas com rebanhos de ovelhas, na maior parte imensos vazios.
Chegamos a Punta Arenas às 17h25min, fiquei um pouco preocupado com o horário, pois o outro ônibus sairia às 18h00min. De Ushuaia até Punta Arenas na empresa foi a Tecni Austral, única que opera este trecho na baixa temporada. De Punta Arenas seria a Bus Sur.
Depois de me preocupar com o horário, lembrei que havia o fuso horário entre Argentina e Chile de uma hora, então teria uma hora a mais na cidade. Ainda no Brasil quando planejava a viagem havia considerado passar pelo menos um dia em Punta Arenas para visitar a punguineira, aqui é onde fica a maior concentração de pingüins Magalhães da América, são cerca de 60 mil casais. Mudei de idéia depois de saber que no inverno eles migram para o norte, talvez ainda volte algum dia para conhecer a tal praia. Aqui em Punta arenas há também a zona franca, onde muitos mochileiros passam para comprar principalmente equipamento de trekking e acampamento, como por precaução também já havia comprado tudo no Brasil, não havia muitos motivos para ficar mais em Punta Arenas.
No pouquíssimo tempo que passei em Punta Arenas só foi possível caminhar pelas principais avenidas e tirar algumas fotos, dizem que além da pinguineira existem alguns museus, um forte e a zona franca (que acabei de comentar). Já eram quase 18h00min, horário local e retornei ao local de onde partiria o ônibus para Puerto Natales. Aqui também não havia nenhuma rodoviária, eram dez passageiros já contando comigo e seguimos viagem, seriam então mais três horas e meia até o destino final.
Bastante cansado da viagem (o propósito era descansar) e sem ter feito nenhuma reserva em nenhum hostel comecei a me preocupar, no inverno o sol se põe muito cedo e já era noite escura. O assistente do motorista (não sei exatamente a função, mas por aqui é comum haver além do motorista, mais uma pessoa que serve café, retira malas, essas coisas...), percebendo que eu era estrangeiro me entregou um panfleto de um hostel, fiquei agradecido porque pelo menos agora tinha alguma opção.
O desembarque foi engraçado, logo na saída havia três senhoras, elas ofereciam suas casas para hospedagem, a primeira que conversei era justamente a do panfleto, ela me ofereceu um quarto compartilhado por $6.000 CHP por noite com café da manhã incluso, o que dá pouco menos que R$30,00, decidi então por este hostel (Danicar era o nome), a casa fica a umas cinco quadras de onde o ônibus havia parado, não existem grandes hotéis em Puerto Natales, somente pousadas no máximo e as pessoas oferecem suas casas para hospedagem, o que gera uma boa receita principalmente nas altas temporadas. Onde fiquei, a senhora por receber muitos turistas tinha também uma pequena agência, então já podia agendar os passeios, comprar passagens, coletar informações, etc. A senhora de nome Beth foi muito prestativa, pude escolher o quarto e apesar de haver quatro camas de solteiro pude ficar sozinho, pois não havia muitos turistas na cidade. Acomodei-me e fui tomar um banho, já era tarde e meu estômago côncava de fome. Fui até um restaurante próximo onde comi salmão e mariscos, por aqui é muito comum e o sabor é melhor que no Brasil, estava precisando de uma boa refeição ($5.600 CHP), voltando para o hostel decidi que no outro dia não iria ainda para Torres del Paine, teria ainda que comprar suprimentos no mercado, mais medicamentos para emergências, etc., então tiraria o dia para descansar e aproveitar a cidade.

Dia 5, quarta-feira - 25/08/2009 - Ushuaia – Parque nacional da terra do fogo

Hoje foi meu último dia em Ushuaia e amanhã bem cedo partirei para Puerto Natales. Com todos os problemas causados pelo bloqueio do cartão o trekking no parque nacional ficou para o último dia, hoje. Eu sabia que Eugênia também iria ao parque, mas ela havia agendado um transfer mais cedo, às 9 da manhã enquanto eu iria somente às 10, então provavelmente não nos veríamos mais.
Acordei descansado às 08h00min, minha roupa toda cheirava fumaça por causa da noite passada, tentei fazer o que pude sem molhá-las, já que teria que vesti-las em seguida (um mochileiro não pode se dar o luxo de carregar muita bagagem). Depois de tomar um banho, um café rápido (havia gasto muito tempo limpando as roupas) aguardei na recepção do hostel, a van passou às 10h03min, eu era o último, depois de mim fomos direto para o parque.
O caminho para o parque é muito bonito, mas eu ainda não havia decidido que trilha faria. Depois de quase uma hora a van chegou ao refúgio Lago Roca, Dalí poderíamos iniciar uma caminhada, mas conversando o motorista nos mostrou um mapa e uma opção diferente acabei mudando de idéia, percebi que havia pelo menos mais quatro pessoas de nacionalidade não argentina na van, dos quatro, dois estavam juntos (um casal), esses partiram logo que a van parou, e ficamos eu e mais duas pessoas aparentemente também sozinhas sem saber muito bem o que fazer, conversando com eles nos apresentamos e decidimos então seguir caminhada juntos.
Eles eram Bem, um australiano de 27 anos que passava as suas férias de três meses viajando a América do sul desde a Bolívia e Malwina, uma polonesa também de 27 anos que vive e trabalha em Londres, ambos funcionários públicos.
Bem era um cara meio desajeitado, mas aparentava uma boa pessoa.
Malwina parecia ser mais observadora, adorava fotografia e carregava uma câmera bem legal. Com apenas quinze minutos de caminhada os dois já estavam impressionados com a beleza do lugar, eu também estava. O dia, assim como aconteceu no domingo, foi ensolarado, me disseram que dias assim em Ushuaia são raríssimos ainda mais no inverno. Sentimo-nos privilegiados com isso...
Além da paisagem, era muito bom ver os animais, patos caminhando sobre lagos congelados, coelhos, só não conseguiram ver os tais castores. À medida que o sol brilhava, a lâmina de gelo sobre o lago começava a derreter, o impressionante de tudo isso era o barulho do gelo trincando, era como se alguém estivesse quebrando vidros e é uma pena não poder descrever tão bem isso aqui somente com palavras, mas consegui capturar algo com minha câmera...
O dia estava fabuloso, mas o frio estava sempre presente. Durante meia hora, depois de uma caminhada mais forte, tiramos os casacos até que o sol se escondeu e o vento gelado mostrou novamente sua cara.
Iniciamos a caminhada às 11h30min sabendo que a última van para Ushuaia retornaria às 17h00min, conseguimos chegar ao local previsto às 16h15min, tempo suficiente para tomar um chocolate bem quente ($25,00) antes da volta pra Ushuaia.
Bem ainda saiu para tirar mais algumas fotos e Malwina e eu ficamos conversando um pouco mais, ela ainda me contou sobre os lugares que já passou e viveu, disse que aos 20 anos deixou seu país para estudar, cursar a universidade. Ela quer ainda concluir um PHD em filosofia, já o sonho de Bem é ser historiador. Malwina já esteve no Brasil e comentou que gostou muito de Salvador, mas nunca visitou São Paulo...
De volta a van, todos realmente muito cansados e acabamos dormindo quase toda a viagem, na volta descemos da van na parte baixa da cidade, perto já do porto, Malwina e Bem Iriam ainda visitar o museu do presídio, onde ontem estive, e eu precisava testar o cartão de viagem que iria salvar a minha pela, graças a minha amiga Valéria.
Combinamos então os três de nos encontrarmos num bar naquele dia ainda às 19h30min, eram 18h10min. Depois de confirmar o cartão fiz algumas ligações de decidi voltar para o hostel. Infelizmente não pude avisá-los que não os encontraria, mas não achei justo comigo esperar, não que eles não fossem pessoas legais, adorei conhecê-los, eram pessoas simpáticas e divertidas, acontece que minha cabeça estava estourando e eu ainda tinha que lavar algumas roupas e preparar minha tralha para cruzar a fronteira no dia seguinte para o Chile.
Chegando ao hostel tomei alguns analgésicos e fui tomar banho. Algo que valorizei de verdade nesses últimos dias frios que aqui passei foi um banho quente, havia momentos que era o que eu mais desejava. Isso me faz pensar também que às vezes na vida precisamos passar por algumas situações que de fato nos desafiem, seja mental ou fisicamente para que então possamos dar o correto valor ao conforto e a sensação de bem estar e digo mais, acho ainda que essa sensação de bem estar é cada vez melhor quanto mais situações dessas (que nos desafiam) enfrentamos.
Logo depois do banho a dor de cabeça passou e eu já havia também lavado algumas roupas e secado em seguida. Minha bota estava bastante suja e desta vez também com barro, então aproveitei o momento para testar a sua resistência a água, aprovada.
De volta ao quarto, depois de cruzar pela incontável vez o quintal gelado correndo (isso não é engraçado), comecei a separar na mochila cargueira tudo aquilo que levaria para o trekking deixando na mochila menor itens que ficariam no hostel em Puerto Natales, hostel que eu não fazia idéia, pois não tinha nenhuma reserva, contarei com a sorte dessa vez ao invés do costumeiro planejamento.
Enquanto preparava minha mochila conversava com Ahmed, Ahmed é um egípcio-argentino, como ele gostava de dizer.
Ele é casado com uma argentina há alguns anos, tem seus trinta e poucos e ao contrário da grande parte dos que estavam naquele hostel, estava buscando um trabalho em Ushuaia e não aventuras, Ahmed já viveu alguns anos nos Estados Unidos, onde trabalhou para o exercito e polícia americana.
É nascido em Cairo e vem de família de posses, Ahmed contou que dentro da tradição das famílias egípcias ele deveria ter se casado com uma de suas primas, esta seria a forma de o dinheiro, digamos, permanecer do mesmo “lado”. Ao decidir-se casar-se com a atual esposa, Ahmed renunciou tudo que tinha por direito no Cairo. Durante os três dias que tive contato com ele, me pareceu uma pessoa muito integra, com propósitos.
Ele falava sempre de seu filho de quatro anos e na esposa, a qual chamava de “mi señora”, ele contou que escolheu vir para Ushuaia, pois aqui se pagam melhor, as condições climáticas, frio severo que assola a cidade durante todo o ano, mesmo no verão, faz com que poucos queiram viver por essas bandas, minha última noite no hostel também seria a ultima de Ahmed, no dia seguinte ele iria para outro local, onde encontrou um dormitório e iria pagar algo em torno de $700/mês, o custo de vida na cidade não é baixo para quem recebe em pesos argentinos, o plano dele era conseguir um emprego, algo que lhe rendesse uns dois mil por mês, seu custo de vida seria de $1.200, o restante enviaria para a esposa para que depois de um tempo a esposa e o filho também pudessem vir, desta forma a esposa o ajudaria também trabalhando por aqui.
Ele tem curso superior e fala três idiomas, seu sonho é trabalhar mais uns três anos e conseguir recursos para iniciar um negocio exportando couro, carvão e madeira.
Depois de uma longa conversa fomos tomar café na cozinha, eu não havia jantado então ele me ofereceu uma refeição que havia preparado na noite anterior, macarrão com carne. Depois de comer tomamos o café e voltamos para o dormitório, onde peguei seu contato no “facebook”, percebi que a maior parte das pessoas que viajam e tem amigos no exterior usam o “facebook”, então é algo que vou precisar criar depois da viagem e tentar encontrar os amigos feitos enquanto descubro esse pedaço da América.

Hora de me despedir da cidade que vai deixar saudades...

sábado, 26 de setembro de 2009

Dia 4, terça-feira - 24/08/2009 - Ushuaia – Problemas... Museu do fim do mundo, cães na neve e luau

Ao invés de 08h00min, acordei às 08h40min. Depois de todos os preparativos (banho, curativos nos dedos, etc.), fui tomar café da manhã, o mesmo da manhã anterior e em seguida saí em busca de um caixa eletrônico, tentar sacar algum dinheiro.
Foi um dia que começou mal, mas acabou bem. Depois de algumas tentativas percebi que meu cartão já havia sido bloqueado, um grande problema, pois o dinheiro já estava acabando. Contei novamente com a ajuda da Valéria no Brasil. Ela havia me emprestado um cartão de viagem (travel Money) que seria muito útil nesse momento. Depois de resolver esse percalço liguei pra casa enfim, minha mãe estava preocupada, falei alguns minutos com ela e depois com meu pai, era aniversário do meu velho...
As ligações me custaram $55,00 ARS, principalmente ligando para o banco. Depois disso fui até a agência de turismo consultar a passagem de ônibus para Puerto Natales (próximo destino), ainda sem decidir o que fazer, saí da agencia e fui pensar se ainda faria o passeio para o parque nacional, como teria mais um dia completo em Ushuaia e já estava tarde, eram 12h30min, decidi ficar na cidade e conhecer o presídio (antigo, atual museu do fim do mundo) e depois fazer o passeio com os cachorros...
Antes disso busquei algum lugar para almoçar, com restrição de dinheiro a prioridade era encontrar algum lugar que aceitasse cartão de crédito ou tivesse um valor baixo, almocei num pub, comi um x - tudo e tomei uma água mineral, saiu por $32,00, em seguida rumei para o museu do presídio, a entrada para países do Mercosul estava em $40,00, mas consegui um desconto de estudante e o preço caiu pra $30,00.
O museu está longe de ser a melhor atração de Ushuaia, mas vale à pena visitar. Algumas alas expõem fotografias e histórias da prisão, algumas celas têm bonecos em tamanho real simulando os condenados, algumas histórias são bem impressionantes, por exemplo, o caso dos prisioneiros que tentavam fugir e depois retornavam, pois não tinham opção, a falta de alimento e as barreiras naturais como o estreito de Magalhães e o frio cortante eram mais eficazes que qualquer sistema moderno de monitoramento de prisioneiros.
Presos considerados perigosos eram transferidos para cá e obrigados a trabalhar principalmente na construção civil, fato interessante é que a cidade de Ushuaia surgiu depois do presídio e em função dele.
Ushuaia é a cidade mais austral do planeta, o que a faz o principal ponto de acesso à antártica, pólo sul. Antes de partir de viagem cheguei a ler varias histórias sobre a exploração da antártica, melhor dizendo a conquista, já que é relativamente recente a primeira chegada do homem nesse território tão hostil (irá completar 100 anos em 2011). Lembro-me da triste historia dos exploradores ingleses da missão Discovery, na verdade muitos homens morreram na tentativa de chegar ao continente, sejam pelos mais diversos fins, claro que na maior parte dos casos, fins econômicos de seus governos.
O museu conta também a história desses homens, comandados pelo explorador Scott, lembro-me às vezes da carta deixada por ele após perceber que não teriam condição de voltar a ver sua família... Acho que vale a pena ler.

“Para minha viúva.
Minha muito querida,
Estamos em situação extremamente difícil e tenho dúvidas de que conseguiremos ultrapassá-la. Nos poucos momentos em que somos abençoados com um minguado calor, na hora do almoço, aproveito para escrever cartas que preparem a todos para um fim possível. A primeira carta naturalmente é para você, em quem meus pensamentos, acordado ou dormindo, principalmente se concentram. Se algo me acontecer, eu gostaria que soubesse o quanto você significou para mim e o quanto me confortam, neste momento de partida, as agradáveis lembranças de nossa vida em comum.
Gostaria que você também fosse por elas confortada e que tivesse certeza de que não sofrerei nenhuma dor, deixarei o mundo em plena atividade, com toda a saúde e vigor. Infelizmente já está estabelecido: quando as provisões acabarem, nós simplesmente ficaremos onde estivermos, a uma curta distância de algum outro posto.
Portanto você não deve imaginar uma grande tragédia. Nós estamos, e temos estado há semanas, muito ansiosos, naturalmente, porém em esplêndida condição física, e nosso apetite compensa todo desconforto. O frio é cortante e, às vezes, irritante – é quando uma refeição quente o afasta e é tão apreciada que sem ela dificilmente suportaríamos.
A situação piorou bastante desde que interrompi esta carta. Nosso Titus Oastes, infelizmente, não suportou; ele estava em péssimas condições. Nós, os demais, ainda continuamos e pensamos na possibilidade de uma chance de vencer. Contudo, o frio não cessa nem um pouco. Estamos a 20 milhas do posto, mas temos pouca comida e o combustível é escasso.
Bem, minha querida, quero que você enfrente tudo isto com muita sensatez, como, aliás, tenho certeza de que o fará. O menino será seu conforto. Eu tinha feito planos para ajudá-la a criá-lo, no entanto, sei que ele estará protegido com você e isso me conforta. Penso que tanto ele como você receberão cuidados do nosso país, razão pela qual, afinal de contas, sacrificamos nossas vidas. Que nossos esforços sirvam de exemplo. Deste ponto em diante, estou escrevendo as cartas na parte posterior deste livro. Por favor, envie-as para os vários destinatários.
Devo escrever uma cartinha para o menino, para que ele leia, se tiver oportunidade, quando se tornar adulto.
Minha muito amada, saiba que não alimento nenhum sentimento tolo quanto à possibilidade de vir a se casar novamente. Quando o homem certo chegar, para ajudá-la a viver, você deverá voltar a ser feliz.
Espero deixar uma boa lembrança e, por certo, este fim de nenhum modo lhe será causa de constrangimento. Ao contrário, penso que o menino só terá motivos para se orgulhar e em que se basear para constituir sua família.Querida, não é fácil escrever por causa do frio (70 graus negativos) e nada mais senão o abrigo de nossa barraca.
Você sabe que eu a amo, você sabe que meus pensamentos ficarão constantemente com você e, oh, minha querida, você deve saber que o pior desta situação é o pensamento de que nunca mais a verei. O inevitável deve ser encarado – você me incentivou a ser o líder deste grupo e sei que você previu que seria perigoso – eu cumpri minha tarefa, não foi?
Deus lhe abençoe, minha querida. Tentarei escrever mais, depois. Continuo a escrever nas páginas de trás. Desde a última vez que lhe escrevi, nos aproximamos 11 milhas de nosso posto. Tivemos apenas uma refeição quente e, por dois dias, refeição fria. Era para termos lá chegado, mas ficamos presos por quatro dias devido a uma terrível tempestade. Acho que perdemos nossa melhor chance. Decidimos não por fim às nossas vidas e lutar com a esperança de chegar àquele posto. Certamente, será sem dor, portanto não se aflija.
Escrevi cartas em páginas esparsas deste livro – será que você vai conseguir enviá-las? Estou ansioso por você e o futuro do menino. Faça-o interessar-se por História Natural, se você conseguir – é melhor do que jogos. Algumas escolas encorajam esse estudo. Sei que você o manterá, o máximo possível, ao ar livre. Tente fazê-lo acreditar em um Deus, é reconfortante.
Oh, minha querida, minha querida, que sonhos eu tive a respeito do futuro do menino, e ainda assim, minha garota, sei que você enfrentará estoicamente todas as dificuldades. Sua foto e a do menino serão encontradas em meu peito – e também aquela, no porta-retrato vermelho marroquino, oferecido por Lady Baxter. Na minha bolsa particular, há um pedaço da bandeira da Inglaterra – que hasteei no Pólo Sul – junto com a bandeira negra do Amundsen e outras lembrancinhas. Dê um pedaço da bandeira da Inglaterra ao Rei, e um pedacinho menor para a Rainha Alexandra, e o resto guarde como um humilde prêmio para você!
Quanta coisa, quanta, eu poderia lhe contar desta viagem. Quão melhor foi do que ficar perambulando no conforto do lar – que histórias você teria para contar ao menino, no entanto a que preço! Não mais verei seu rosto tão querido!
Querida, procure confortar a mamãe. Vou escrever umas poucas linhas para ela neste livro. Também fique em contato com Ettie e os outros. Oh, mantenha uma postura corajosa diante do mundo; não seja orgulhosa demais a ponto de não aceitar ajuda que favoreça o menino. Ele deve ter oportunidade de conseguir uma boa profissão e fazer algo neste mundo.
Não terei tempo para escrever a Sir Clements – diga-lhe que pensei muito nele e nunca me entristeço por ele ter-me posto no comando do Discovery.
“A última carta de Scott da Antártica”

...voltando ao relato da minha viagem.

Algumas alas do presídio estão reformadas e reformuladas, mas existe uma em especial que não possui nem mesmo sistema de calefação, então é um lugar bastante frio, consegui ficar por lá alguns minutos, o lugar não trás boas idéias.
Os castigos aos presos na maioria dos casos estavam relacionados ao frio, ferramenta abundante por aqui... Outros como ficar sem ver a luz do dia por um período longo deveriam ser atormentadores em um lugar tão deprimente.
Depois do presídio, quase 16h00min, precisava voltar ao hostel, pois às 18h00min passaria o transfer para o passeio com os cachorros na “Terra Maior”, no caminho passei numa padaria para comprar alguns suprimentos $14,00 ARS e rumei para o hostel, um banho rápido e às 17h45min já estava pronto aguardando. Junto comigo uma garota também aguardava na recepção, mas não perguntei se seria o mesmo passeio, chegando a van embarcamos e então e conversamos.
Seu nome Eugenia, uma argentina, engenheira química de Córdoba que mora e trabalha em Buenos Aires e está de férias por duas semanas, irá passar parte aqui em Ushuaia e parte em El Calafate, como ela também estava sozinha ficamos juntos até a volta depois do passeio.
Durante o percurso a paisagem das montanhas era magnífica, o motorista percebendo que todos tiravam fotos pelos vidros, estacionou a van por alguns minutos, foi bacana e estava bem frio do lado de fora, imagino que a temperatura era menor que -10°C. Voltamos para a van e mais quinze minutos até que chegamos à Terra Maior, onde aconteceria de fato o passeio, $240,00 ARS.
Havia algumas opções como fazer a ida de raquetes (acessório para caminhar no gelo plano), de moto-neve ou de cachorros e a volta com as mesmas opções. Eu havia escolhido a ida com as raquetes caminhando e a volta de trenó puxado pelos huskies siberianos, Eugênia escolheu o mesmo e partimos para calçar as raquetes. O local onde é feito o passeio é uma grande planície, o guia nos disse que era um glaciar muitos (milhares) anos atrás e que continua a perder massa, atualmente a planície de gelo perde 1 mm por ano de espessura, em função é claro de todo aquecimento global que vem sendo observado e quantificado em todo planeta e que está ainda mais evidente nos pólos...
Pudemos ver a agitação dos cachorros, eles ficam realmente ansiosos para puxar os trenós, eles tem uma afinidade incrível com o gelo, deitam e rolam com se estivesse na grama e são extremamente dóceis.
Com as raquetes nos pés rumamos para o local predeterminado, onde teríamos também o jantar, a caminhada foi divertida, o guia foi contando histórias sobre o lugar e é claro que não vou conseguir escrever tudo aqui... Algumas paradas para fotos e depois de algumas pequenas fogueiras pelo caminho, já adentrando um pequeno bosque havia uma cabana, mas sem o teto. Feita de madeiras e fibras conforme as versões indígenas da região, algo como sapé, mas mais fibras mais duras e resistentes, o céu estava extremamente estrelado e eu confesso nunca ter havido céu assim.
Dentro da cabana uma grande fogueira, tudo preparado para o luau. O clima era bom, de alegria e havia musica (violão) e descobri que mais da metade das pessoas que estavam no passeio eram brasileiros, a fogueira bem quente fervia o vinho que era servido e depois o jantar, que também fora preparado lá, um cozido de lentinha com carnes e bacon. Estava tudo muito bom e a sobremesa por fim, algumas lascas de maça com vinho. Antes de voltarmos ainda teve o café, também feito na fogueira.
Depois do jantar, a volta. Nosso grupo estava no primeiro dos trenós puxado por oito huskies, iam cinco pessoas e o guia. O trenó deslizava suave pelo gelo e os cães pareciam muito satisfeitos, todos os comandos eram feitos por voz e não havia castigos para os cães. Chegamos ao refugio em mais quinze minutos até voltarmos para a van, a noite estava realmente linda...
Na chegada ao hostel me despedi de Eugenia e fui para o meu quarto, havia um argentino que veio para Ushuaia em busca de trabalhão, mas ainda não sei o seu nome.
Algo que havia esquecido... Depois do almoço acabei comprando a passagem para Puerto Natales, $259,70 ARS, viajo na quarta-feira às 05h00min.

Agora são 00h18min, preciso ir pra cama.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Dia 3, segunda-feira - 23/08/2009 - Ushuaia – Navegação canal Beagle e Cerro Martial

Hoje é 24/08, mas vou iniciar relatando o dia de ontem, 23/08.

Não consegui escrever nada na volta pro hostel, estava realmente muito cansado. Acordei no terceiro dia às 07h40min da manha, a intenção era conseguir fazer a navegação pelo canal Beagle, eu já havia pesquisado antes sobre horários e melhores opções. Apos acordar fui me trocar e tive que atravessar correndo algumas vezes o quintal gelado do hostel, pois é, o dormitório é separado dos banhos e cozinha, então é preciso sair pra mudar de ambiente. Isto não seria um problema no Brasil, mas aqui com temperatura externa máxima por volta de -3°C? é de gelar a alma.
Entre idas e vindas correndo pelo quintal preparei minhas coisas, fiz minha mochila menor e guardei aquilo que não precisaria na mochila cargueira que ficaria no hostel.Na cozinha havia um cesto cheio com laranjas, o café era bom, tinha ovos, pães, cereal, leite, chocolate e as laranjas... Nada de luxo, cortei as laranjas e fiz uns dois copos de suco, em seguida me servi de um pouco de cereal com leite e fui até a recepção tentar conseguir mais informações sobre a navegação no canal Beagle, desci em seguida a pé até o porto onde existem uns cinco quiosques com agencias que fazem a tal navegação. Antes de comprar fui até o centro de informações turísticas onde a atendente, bastante simpática confirmou que havia dois horários, as 10 e as 15. Escolhi um quiosque e comprei o ticket ($141,00 ARS), comigo havia mais seis pessoas. O barco leva até 26 passageiros, mas é baixa temporada, o que ajuda a fazer a navegação mais tranqüila.
O zarpe aconteceu às 10h30min num iate pequeno e confortável. O visual foi espetacular, montanhas nevadas por todos os lados e temperatura por volta de -8C, mas do lado de fora com o movimento do barco e o fato de estar em mar aberto fez com que a sensação térmica fosse ainda menor, ficar do lado de fora sem luvas era possível pra mim por 10 minutos, depois disso já não sentia mais os dedos. Durante a navegação nossa guia explicava sobre rotas para se chegar a Ushuaia, curiosidades sobre a região e dados de navegação, profundidades, etc.
Conheci um brasileiro que também havia embarcado, por coincidência além de ser de São Paulo, trabalha e mora em Barueri.
No percurso o barco aproximou-se de três ilhas, uma delas com uma quantidade enorme de pássaros que a principio confundi com pingüins, eram cormoranes. Chegamos a observar um casal de pingüins na água. Soube que durante o inverno eles migram para o norte, no verão aqui fica cheio deles.
Depois dos pássaros os lobos ou leões marinhos, criaturas belíssimas e bastante imponentes, principalmente o macho que é maior e tem algo entre a cabeça e o pescoço que lembra um leão. Cada macho vive com cerca de quinze fêmeas e quando há brigas em muitos casos ela só acaba com a morte de algum deles. Eles fazem um barulho que às vezes chega a ser engraçado, são urros! Por último o barco atracou numa ilha no meio do canal Beagle, com o oceano pacífico de um lado e o atlântico de outro. Ficamos lá por cerca de meia hora e retornamos para o barco de onde voltaríamos para o porto em Ushuaia, a duração da navegação foi de 4 horas e durante podíamos nos servir de leite, chocolate, chá e biscoitos. Na volta ainda brindamos com licor de café, dessa vez tomei um pouquinho.
Depois de voltarmos ao porto, conversando com o brasileiro André, decidimos ir até o cerro Martial.
Chegamos ao cerro por volta das 15h40min, sendo que o ultimo teleférico desceria às 16h30min, hesitei um pouco em subir, mas depois acabei decidindo, mesmo sabendo que ficaria pouco tempo lá em cima ($50.00 ARS), a vista de cima foi bem legal e cansei andando na neve fofa, o frio era de matar e quando descemos meu pé já estava congelando, havia caído um pouco de neve dentro da minha bota. (depois aprendi a ajustar a polaina da calça de alpinista...), já eram quase 17h00min e eu havia apenas tomado café da manha.
Na base do cerro existe uma confeiteira, mas já estava fechando e o cara que nos atendeu não foi nada gentil, demorou uns 15 minutos pra dizer que só tinha alguns pedaços de bolo.
Tínhamos pensado em voltar a pé, (havíamos ido de taxi), são uns 5 km, mas com a fome e todo gelo na estrada seriam umas 2 horas pelo menos caminhando, não parecia mais ser uma boa idéia e então pegamos outro taxi voltando pra cidade em busca de algum lugar pra comer, ainda passei no hostel pra trocar a meia molhada, a bota resistiu bem à neve, depois de algumas voltas fomos parar num restaurante chamado “Ramos Generales”, o lugar é legal, era um armazém e foi transformado em restaurante, mas mantém toda decoração rústica.
Fiquei em dúvida sobre o que pedir estava faminto e ao mesmo tempo não queria gastar muito, mas depois decidi ter uma boa refeição, já que na noite anterior havia comido uma sopa instantânea com cebola em conserva com salame... Escolhi então uma massa com salmão e mariscos, uma escolha e tanto, umas duas garrafas de água com gás, o jantar saiu por $53.00 ARS, mas valeu cada centavo.
Antes do jantar eu havia tentado sacar dinheiro com o cartão múltiplo do banco, sem sucesso, depois do jantar voltei pro hostel, uma baita subida até chegar, foi um dia e tanto, cheguei cansado e um banho quente era tudo que eu queria, depois do banho fui deitar, tinha que acordar no outro dia às 08h00min e partir pro parque nacional as 09h00min, havia a possibilidade de reduzir minha estada em Ushuaia em um dia, mas tudo dependeria de encontrar passagem de ônibus para a terça feira e veria isso na manhã seguinte, assim como a questão do cartão do banco...