sábado, 12 de dezembro de 2009

Dia 9, domingo - 29/08/2009 - Torres Del Paine – Destino: Acampamento Italiano – Dia 2

Como mágica hoje acordei completamente revitalizado do dia anterior e disposto a encarar mais desafios, eram sete da manhã e o frio permanecia castigando, decidi não tomar banho pela manhã, mesmo sabendo que o próximo seria somente na volta a Puerto Natales, um detalhe que acabei esquecendo de mencionar no relato do dia anterior foi o esquecimento da escova e do creme dental em Puerto Natales, sem isso tive que me virar com algumas raízes de plantas e usar até xampu que eu tinha na mochila. Pela manhã fiz o mesmo, me troquei e preparei minha mochila deixando aquilo que eu considerava desnecessário para trás, acredito que desde ponto em diante consegui reduzir em pelo menos 5 kg o peso total.
Ao chegar à sala encontrei as suíças e o dono da tal barraca do relato de ontem, hoje conversamos e agora ele tem um nome, era Pablo, um espanhol que vive na Bolívia.
Clement já não estava, pois havia saído para chegar ao glaciar Grey, segundo o que disseram, ele tentaria fazer o percurso W completo e nos alcançar no acampamento italiano à noite.
As suíças haviam decidido fazer o mesmo percurso que eu, abdicando também da visita ao glaciar, mesma decisão tomada por Pablo. Conversamos um pouco ainda analisando o mapa e o que seria possível fazer no dia, o acampamento italiano fica a 7,6 Km (duas horas aproximadamente) de onde estávamos, porém para fazermos a segunda perna do W teríamos que subir até o acampamento britânico distante 5,5 Km do italiano (2 horas e meia), de onde ainda partiríamos para chegar a um mirante, distante 2 km do acampamento britânico, mais meia hora. Depois o percurso de volta até o acampamento italiano onde passaríamos a noite. Em resumo, para o dia tínhamos 22,5 Km para percorrer com uma estimativa de duração de 7 horas, sem considerar as paradas para almoço, descanso, etc.
Clement seguiu rumo ao glaciar grey e tentaria nos encontrar no acampamento italiano a noite, caso ele decida seguir conosco desse ponto em diante vai abdicar da segunda perna do W, o acampamento britânico.
Depois de conversarmos bastante sobre o caminho decidimos iniciar o trekking, já eram 09h15min quando deixamos a hostelaria.
Novamente todo aparato contra o frio era usado, toca, luva e cachecol, a temperatura externa estava por volta de -7°C e alguns minutos foram suficientes para começar a sentir calor.
Pablo seguia na frente, parecia bem mais acostumado a esse tipo de trekking, na Bolívia ele já havia feito algumas expedições em lugares e até mesmo mais frios.
A disposição aumentou desde a última noite e eu conseguia acompanhá-lo na frente, Pablo é agrônomo e nasceu em Barcelona, hoje trabalha com desenvolvimento de povos na América latina, dizia que já esteve no Brasil por dois anos trabalhando na Amazônia, também com a mesma finalidade. Atua normalmente em ONGs e a atual tem ligação com o governo Boliviano de Evo Morales, conversamos um pouco também sobre política, não diria que Pablo chega a ser um extremista, mas acredita em questões nobres, não parece ter tantas vaidades e passa uma imagem de integridade.
A dificuldade nesse trecho é média, passamos por algumas planícies, mas encontramos durante o caminho, principalmente na última parte muitas montanhas e pedras para cruzar, o tempo não parecia estável, mas não tive problemas quanto a isso, apenas nevou um pouco na chegada, nada que interferisse no trajeto.
No caminho perguntei a Pablo, por ser de Barcelona, se já havia feito o caminho de Santiago de Compostela, pois era algo que gostaria muito de fazer um dia, conversamos a respeito e estou de fato amadurecendo essa idéia, talvez faça em 2011, algo que preciso ainda decidir... Pablo não chegou a fazer o caminho completo, todo o caminho corresponde a uma distancia de quase mil quilômetros.
Logo chegamos (Pablo e eu) no acampamento italiano, lembro-me logo da chegada cruzamos por uma ponte estreita feita de madeira que cruzava um dos canais que resultava do derretimento do glaciar do francês.
A chegada ao acampamento italiano indicava então um momento de descanso, aproveitei para recarregar a garrafa d’água no rio. Algo importante a comentar é que todas as fontes de água dentro do parque torres del paine são potáveis, na maior parte dos casos provem do derretimento dos glaciares ou mesmo do cume congelado das montanhas.
O acampamento estava vazio, sem nenhuma infra estrutura, mas o lugar parecia pelo menos mais protegido do vendo pelo menos. Esperamos as suíças chegarem e então seguimos para o acampamento britânico, um trecho mais difícil por causa da neve que agora chegava ao tornozelo e também pela subida forte, a idéia era chegar ao mirante para apreciar a vista. Como a base seria o acampamento italiano as mochilas ficaram, colocadas no alto lembrando o que havia sido dito quando às raposas que seguem os aventureiros. Comigo levei apenas a garrafa d’água, câmera fotográfica e bastão de caminhada.
Logo na base conseguimos ver o glaciar do francês, a subida toda cruza a região indicada no mapa como vale do francês, passamos em alguns momentos por pedras, cachoeiras congeladas e depois por florestas mortas. Durante a subida encontramos dois alemães, cujos nomes também não me recordo. Haviam subido mais cedo e contavam sobre a condição das trilhas, diziam que tinha neve até o joelho no acampamento britânico, porém que era possível chegar até o mirante para observar as torres e o vale do francês, conversamos mais um pouco com os dois e seguimos subida.
Mesmo antes de alcançar o mirante apreciamos vistas surpreendentes pelo caminho, eu havia levado a garrafa vazia esperando que pudesse encontrar água no caminho, mas tudo havia congelado e me restou encher a garrafa com neve e descongelar com a transferência do calor das mãos para garrafa, isso acabou me rendendo alguns dedos dormentes, mas a sede foi saciada.
Depois de duas horas e meia de subida chegamos ao acampamento britânico, eu imaginava que não encontraríamos estrutura, tão pouco alguém no acampamento, mas de fato não havia absolutamente nada além da placa de indicava que chegamos ao acampamento. O lugar então serviu de descanso, tínhamos agora mais meia hora de caminhada até o mirante de onde retornaríamos para o acampamento italiano, a base do segundo dia.
Aqui a quantidade de neve aumentava bastante e comprometia a velocidade da caminhada, a meia hora virou cinqüenta minutos, mas tanto a bota quanto a polaina resistiram bem e não tive problemas quanto a molhar os pés.
Caminhando no inverno tão rigoroso é muito importante proteger as extremidades do corpo, molhar os pés aqui seria uma tragédia.
O local do acampamento britânico deveria ser de fato um refúgio, havia várias arvores, mas a grande maioria delas já sem vida, mortas pelo inverno, algumas não conseguiram resistir ao peso da neve e racharam no tronco, alguns minutos depois chegamos numa área descampada, deixando para trás o pequeno bosque sem vida, de lá conseguimos ter uma boa vista das torres, o tempo abriu e o céu ainda conservava seu tom azulado.
Mais alguns minutos cruzando o vale do francês e chegamos finalmente ao mirante, o destino do dia. O frio ali era ainda maior, era o ponto de maior altitude desde o acampamento italiano, o vento soprava com força.
Decidimos que utilizaríamos o lugar para comer alguma coisa, eu havia levado nos bolsos alguns pacotes de bolacha além de uma tangerina, ficaríamos vinte minutos no mirante e Pablo aproveitou para ascender um cigarro enquanto também apreciava a vista.
Quase chegando ao final desse dia e a sensação era completamente diferente do dia anterior, aquela noite de sono fora realmente milagrosa e agora me sentia com mais vitalidade e embora já tivesse enfrentado bons desafios ainda me sentia apto para caminhar longas distâncias, é claro que vale a pena mencionar também que esse ultimo trecho foi feito sem as mochilas, o que foi fundamental já que o principal problema que enfrentei era realmente a dor nas costas e nos ombros.
A vista do ponto mais alto no vale do francês era impressionante, olhando de cima víamos toda extensão do vale, o vento soprava forte e levava a neve ainda solta no solo, a direção do vento havia mudado agora e nos empurraria na volta no sentido do acampamento britânico e italiano, penso que a partir daquele momento, quem ainda tivesse alguma pretensão de chegar ao mirante teria mais dificuldade.
Uma sensação de conquista estava presente naquele momento, lembrei do dia anterior em Las Carretas quando fiquei muito próximo de desistir de continuar e me sentia feliz por ter tomado aquela decisão, mesmo que um pouco irracional.
Iniciamos a decida, sem muitas paradas dessa vez, pois o objetivo era chegar o mais cedo possível no acampamento para preparar tudo. Eu estava um pouco preocupado também com as suíças que lá ficaram, elas disseram que também viriam até o mirante, porém nenhum sinal delas e o tempo piorava a cada minuto.
Em vinte minutos chegamos ao acampamento britânico e mais vinte minutos encontramos as duas que subiam sumo ao mirante, paramos um pouco para conversar e elas estavam bastante cansadas e decidiram também retornar conosco, por precaução também, já que o tempo havia mudado e a nevasca aumentava.
Pablo e elas decidiram ainda parar para fumar no caminho, eu segui retornando para o acampamento e nos encontramos novamente quando parei para buscar água.
Chegamos ao fim da tarde ao acampamento para preparar tudo, elas já haviam montado a barraca, encontramos um abrigo do vento e conseguimos colocar as três barracas lá dentro, estávamos na companhia dos últimos raios de luz do dia, aproveitamos então para cozinhar. Preparei uma sopa com macarrão que tinha comigo e também uma boa porção de purê de batatas, o cheiro estava bom e compartilhamos o jantar, nesse dia também preparei suco, tinha comigo um pacote de pó instantâneo.
Comiamos e conversávamos sobre o dia e sobre outras coisas, já era noite e nossas lanternas estavam acesas. É extremamente proibido fazer fogueira no parque em função até mesmo do histórico de vários incêndios, principalmente no verão quando a quantidade de aventureiros é bem maior.
De longe vimos uma pequena lanterna se aproximando do acampamento, era Clement que chegava ao acampamento. Um pouco arriscado caminhar à noite naquele lugar, mas ele parecia experiente. Todo abrigo estava tomado por nossas barracas e Clement precisou se acomodar em outro local, não muito longe dali.
Preparei-me para dormir, novamente escovando os dentes com alguns pedaços de raiz de plantas e algumas gotas de xampu, a água gelada fazia os dentes doerem.
As garrafas d’água eram abastecidas no rio que passava por baixo da ponte estreita que passamos pela manhã quando chegamos ao acampamento. Havia somente um pequeno e fino fluxo no centro, as bordas estavam congeladas.

Voltei para a barraca rapidamente, agora são 21 horas e espero pela mesma noite milagrosa do dia anterior.

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